Rua Guaicurus, 2022 - Um retrato documental que foge dos tabus da prostituição.
- Carol Oliveira
- 14 de jul. de 2022
- 3 min de leitura
Cabine Online por Sinny.assessoria
Distribuição: Embaúba Filmes

O longa Rua Guaicurus de João Borges, cineasta brasileiro, já é capaz de atrair ao público devido a sua história de composição, uma grande pesquisa e imersão na vida das prostitutas da Rua Guaicurus em Belo Horizonte, local em que a atividade já é forma de sustento a mais de 30 anos e para mais de 3 mil mulheres.
Ao longo da imersão para a pesquisa do filme, que foi feita desde 2016, João Borges já buscava uma outra visão da profissão, retirando tabus e sem medo de expor para o público a realidade da vida dessas profissionais, gerando assim, um filme com um caráter muito mais documental do que ficcional, e trazendo ainda, pessoas reais e não apenas atrizes para representa-las.
Quando pensamos em prostituição uma série de pensamentos já vem a mente de cada um, mas dificilmente da forma que vemos no longa de João Borges, que buscou abordar o tema não acompanhando apenas um protagonista e um antagonista, mas sim, tendo como personagem principal da narrativa, o próprio prédio histórico onde acontecem as atividades sexuais.

Desta forma, nos deparamos com diversos clientes e diversas garotas de programa, onde a trama nos leva ao longo de sua 1 hora e 15 de duração a conhecer aspectos que o diretor considerava importante para contar sua história, se pautando principalmente na vida por trás dessas profissionais, o que as fazem chegar até ali, seu passado e seus princípios e cuidados, abordando até mesmo assuntos dificilmente vistos no cinema brasileiro como fetiches, tabus e perigos da profissão, retratados em meio a conversas cotidianas seja em uma refeição ou um diálogo amigável entre as personagens que vivem neste ambiente.
Para compor esta atmosfera documental, Rua Guaicurus, não permite ao público se identificar ou se apiedar de nenhuma personagem em especial, apresentando uma câmera ampla, que se demora em cada cena e em mostrar o verdadeiro cotidiano de uma personagem, apenas para logo em seguida mudar para outra garota de programa e sua história e cotidiano.
Um destaque aqui é a sutileza, a forma com que nenhuma das personagens tem um nome definido e nem tem sua história completamente exposta, ilustrando um cuidado na seleção de informações que poderiam ou não ser levadas para o público.

“Por isso convidamos atores para desempenhar esses papéis. Convidei também uma atriz para fazer o papel da prostituta que estava começando na profissão. Os atores interpretaram seus personagens inspirados em histórias que foram contadas durante o processo de pesquisa. Acho que essa relação contribuiu para a dramatização do filme: o ator profissional trazia segurança ao não-profissional. E este, por sua vez, contribuiu para a improvisação, a espontaneidade, aquilo que escapasse ao controle, dando o tom documental que o filme apresenta.” João Borges.
Apesar disso, o filme esconde o que acha conveniente, mas não nos poupa, de forma que ao mesmo tempo em que diálogos podem ser ocultados por trilhas ou um efeito sonoro ao fundo de forma que não conseguimos ouvir com clareza, cenas de nudismo e sexo já são anunciadas desde o início.
O intuito do diretor aqui é claro desde o início, proporcionar uma nova e diferenciada visão sobre o subúrbio da Rua Guaicurus que é o responsável pela manutenção de um patrimônio histórico da cidade de Bel Horizonte, “Ninguém diz que vai lá, ela é condenada pelo julgamento alheio; no entanto, atravessa os tempos. O conjunto de prédios antigos do baixo centro, em estilo art déco, é um verdadeiro patrimônio da cidade e se mantém de pé graças à atividade sexual intensa da região.” João Borges.
Mas ao mesmo tempo, superar a visão estereotipada da prostituição, fazendo o espectador adentrar naquele ambiente e lidar com questões que em seu dia dia nunca lidaria, mas que estas mulheres lidam no naturalidade, uma verdadeira obra de reflexão e choque, e um banquete para os amantes de filmes documentais imersivos.
“Acho que o filme supera uma visão estereotipada e preconceituosa da prostituição. As trabalhadoras do sexo são objetificadas em sua profissão e, neste sentido, o filme supera este olhar, entrando em seus cotidianos, revelando camadas afetivas que estão para além das relações prostitutivas.” João Borges.

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